quarta-feira, abril 12, 2006

Londres em castelhano

Pois é! Mais uma ausência do país para ir para terras de sua majestade raínha dos anglo-saxões. Há cerca de duas semanas estive lá na minha primeira deslocação no âmbito do novo projecto laboral em que me envolveram. Fui parar a Ipswich; cidade a Este de Londres, quase junto à costa, dizem-me que deve andar perto da dimensão de Leiria. Foi uma semana a estadia. Não foi uma experiência turística digna de grande emoção, mas nem sequer se destinava a isso, foi mesmo para bolir e aí teve utilidade superior. Claro que deu para conhecer um pouco a cidade, principalmente no jantar a meio da semana em que fomos com os colegas ingleses para os pubs e de seguida jantar a um chinês (muito bom) e de volta para outro pub. De resto há a registar (a nível turístico) a tarde em Londres no dia do regresso. Ainda deu para me perder um pouco na City com as malas atrás.
Este fim de semana passado voltei ao reino insular dos bifes. Desta vez fui para passar o fim de semana. Os motivos da viagem voltaram a ser relacionados com o projecto, mas desta vez já não iria para Ipswich; tive a oportunidade de me marcarem a reunião para Londres e por isso pude ficar na metrópole agitada. Mas voltando ao início da viagem: desta vez fui para passar o fim de semana visto que aproveitei o convite feito há já algum tempo por um amigo que por lá desenvolve a bela arte que aprendemos na faculdade*. Tive guarida para os dias não laborais e devo dizer que foi uma experiência muito gira. Gostei muito, até porque se calhar foi o que de mais próximo tive de uma situação de estudante deslocado (sempre tive a vontade de ter ido de Erasmus, mas não calhou...). Reencontrei duas pessoas que já não via há uns anos (com uma mantinha contacto electrónico mas a outra já desde o final da faculdade que não comunicávamos) e fiquei a conhecer pessoas novas e simpáticas, com as quais passei bons momentos e a quem conto poder retribuir a hospitalidade com que me receberam (mesmo não estando elas sediadas na sua terra natal - uma era francesa, outras duas mexicanas, para além de dois compatriotas meus). Estando neste ambiente multicultural, onde não havia um único grã-bretão, acabei por comunicar mais em castelhano (ou o que é que se possa chamar aos sons que saem da minha garganta quando tento comunicar nessa língua - poderá ser algo como espanhoel?!?!) que em português (afinal estávamos em maioria - 3 tugas, 2 xicanas e 1 franciú) ou sequer inglês (afinal era a língua do território e sendo a língua mais universalmente falada, seria 'natural' que fosse a utilizada). Não sei se isso aconteceu por já ser a língua estabelecida lá em casa, se por ser mais fácil a um português entender e fazer-se entender em castelhano que um hispânico aventurar-se pela língua d'Os Lusíadas, se por elas (mexicanas) se conseguirem impor mais que o português? Não sei. O que sei é que 65% das conversas eram numa espécie de castelhano (mesmo se fossem só portugueses envolvidos), 20% em inglês, 13% em português e um resto de 2% numa tentativa remota de falar um pouco de francês. Já por diversas vezes me insurgi contra esta situação (em que eu-português é que tenho de falar na língua dos meus interlocuores de diferentes nacionalidades, quer sejam espanhóis, ingleses, franceses, italianos... e quer seja na terra deles quer seja, principalmente, na terra de Viriato!)**. Devo acrescentar o facto mais preocupante disto tudo: é que mesmo depois de não estar com eles, quando só tinha bifes à minha volta, se pensava no que queria dizer-lhes, os pensamentos surgiam-me primeiro em castelhano e só passado uns instantes é que voltava a mim e recuperava a noção que teria de usar o inglês para comunicar. Felizmente essas palavras em castelhano nunca chegaram a saír da boca para fora, mas também duvido que os meus interlocutores percebessem a diferença entre português e castelhano.
Talvez seja este um pouco o fascínio das grandes metrópoles - a multiculturalidade das pessoas que por lá passam e o pequeno universo que por lá encontramos concentrado (não tão concentrado porque aquilo é muito grande tendo em conta a nossa dimensão).
Feitas as contas, gostei muito da experência de Londres mas teve a ver principalmente pela companhia e pelo lazer que pude disfrutar (claro que a cidade também contribuí muito) e sei (pelo menos conto com isso) que vou lá voltar brevemente e mantenho a esperança de poder reencontrar os meus anfitriães.

* Confesso uma certa preguiça em tentar envolver-me mais pela carreira puramente académica como achava interessante durante os anos do curso e ainda hoje, mas tenho a noção que não seria para mim esse tipo de vida, sei que não teria disciplina para fazer esse tipo de carreira e que por muito que gostasse seria um risco parvo enveredar por um caminho que não seria o adequado para os meus passos.
** Uma das quais foi em plena Madrid, a mandar vir com um grupo de espanholas para falarem em português comigo, e a teimar que não haveria mais conversas senão em português de Portugal. Mas é claro que um homem não move uma montanha, e por isso ainda hoje se verifica esta situação. Mas isso só demosntra que nós somos um povo comunicativo e que procura entender-se com os demais (mas também que somos muito pouco convincentes e que não conseguimos impor a nossa língua).

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