terça-feira, agosto 05, 2008

É tão bom ser menino!*

Já dentro do avião, enquanto vão chegando os últimos passageiros para descolarmos, comenta uma senhora enquanto se levanta do seu lugar:
- Vou buscar pastilhas para os meus ouvidos antes de levantarmos vôo.
Diz inocentemente a sua filha:
- Vais por pastilhas nos ouvidos?!?!

Não sei se era do sono que tinha se foi apenas vontade de me deleitar com aquela pergunta mais que pertinente, mas achei que aquela criança podia bem viver na sua encantadora inocência durante mais uns tempos sem ter de perceber como funciona a pressurização das cabines dos aviões, como as diferenças de pressão ao mudar drasticamente de altitude nos afectam o corpo, nomeadamente a pressão nos ouvidos e como mastigar uma pastilha ajuda a ultrapassar essa reacção.

*Para uma completa percepção do sentido deste título em muito complementa a escuta do fado cantado pelo António Pinto Bastos - Era Tão Bom Ser Menino. Não é que tenha grande admiração pelo senhor, antes pelo contrário, como pessoa não é alguém que me traga lembranças simpáticas; no entanto, tem algumas letras que me ficaram gravadas na memória e que são, independentemente da sua profundidade poética, histórias de verdadeiro sentimento.

quarta-feira, julho 23, 2008

Encore un fois

De volta a terras francas (após experiência au Maroc e breve estágio semanal à Paris), estou agora nas côtes du Rhône (se é que se pode usar o plural desta forma) para uma nova experiência profissional. Deveras bem mais agradável em termos de localização - Lyon é certamente uma cidade bem mais agradável que Casablanca; e espero que também em termos laborais (ambicionamos sempre melhorar, mesmo que a experiência anterior tenha sido já boa). Certamente que a nível linguístico servirá para consolidar os conhecimentos e o léxico gramatical, mas espera-se que os benefícios sejam bem mais abrangentes que estes últimos. De qualquer forma já há melhorias em termos de qualidade de vida e de experiências vividas: os dois rios que atravessam a cidade permitem óptimos passeios pós laborais, consumos nas esplanada circundantes; há também, segundo fonte segura, uma panóplia de restaurantes "estrelados" pela Michelin (enfim, pelo que percebi não são os restaurantes que são "estrelados" mas sim os Chefs) espalhados pela cidade (que, segundo sei de outra fonte, será a cidade europeia com maior densidade de restaurantes) que nos propiciam experiências palatais únicas e que, segundo a primeira fonte, convém aproveitar antes que levem com mais uma estrela em cima e o escalão deixe de ser admissível para o orçamento. Desde já posso regozijar-me de um jantar de duas estrelas que foi, para além de uma viagem à cozinha típica da região, uma novidade em termos de culinária. No entanto, nem só de estrelas se faz a cozinha da cidade, e há outros pequenos restaurantes típicos ("correntes") que enchem bem as medidas. Por outro lado, há também o cinema. Já deu para aproveitar para ver um filme francês que dificilmente estreará chez-nous, e embora as legendas tenham feito alguma falta para apanhar a história (principalmente os detalhes) a 100%, já foram duas horas e meia de filme bem passados. No entanto, há que ter sempre em conta as PPP, o que pode limitar algumas ideias. O preço de um bilhete de cinema na CNP (Cinema National Populaire - uma espécie de Cinemateca em formato de cadeia de cinemas) já ascende aos €7,50 e um bilhete num cinema comercial fica em €10,00; coisa que, para quem em Portugal pode ver filmes à vontade (dá muito jeito o Medeia Card!) ou a €5,50 já custa um pouco e limita as opções.
Mas enfim, il faut profiter (de la ville, des restaurants, des parcs, des quais, du cinèma) et c'est ça que souhaite faire pendant les mois que je serais ici!

terça-feira, maio 13, 2008

Olho de Falcão

Hoje de manhã, a caminho do trabalho, conduzindo na via rápida, vejo um pequeno corpo em cima do traço contínuo que separa a via da esquerda da berma esquerda e do separador central. Poderia ser um papel, um saco, um animal morto, uma pedra... não era perceptível à distância a que inicialmente o avistei. Conforme ia naturalmente avançando na sua direcção, comecei a ganhar noção das suas proporções, formas e cores. Percebi que ganhava uma postura vertical, bastante estável e não influenciada pelos vários automóveis que por ele passaram. Um pouco mais perto e percebi que era um pássaro, vivo, de pé. Quando por ele passei tentei perceber exactamente o que era. Não posso estar cem por cento certo; a minha primeira ideia foi que se tratava de um mocho, até porque parecia que a cabeça estava virada de lado para o separador central (estando o corpo virado de frente para os carros que, como eu, seguiam nessa faixa), mas o seu tamanho pareceu-me demasiado pequeno para o que conheço dos mochos. As penas de tom castanho, mais ou menos escuras, e a dimensão do corpo e da cabeça, bem como a imagem que ficou do instante que consegui focá-lo, deixaram-me a pensar que seria um falcão. Sendo uma via rápida, não seria seguro abrandar muito (especialmente estando na faixa da esquerda), pelo que mantive uma velocidade constante antes, durante e depois passar por ele. Vi-o por breves segundos, contados ao ritmo do velocímetro, mas a sua imagem e a sua presença ficou-me presa na retina e na cabeça por vários minutos. Não só pela situação bizarra, mas principalmente pela postura que o pássaro mantinha: perfeitamente estático, de pé, de olhar no separador central quando lhe surgiam de frente dezenas de automóveis ruidosos a velocidades significativas, traçando tangentes mais ou menos chegadas. Parecia que nem uma pena se mexia, no entanto era perceptível que estava vivo. O que estaria ele ali a fazer? Como terá ido lá parar? Porque parecia tão indiferente a tudo o quanto se passava em seu redor? Seria capaz de sair dali sem mazelas? Eu não poderia ter feito nada para influenciar o desenrolar da sua situação, apenas o que fiz me garante que em nada o afectei - continuei a andar normalmente, sem ser demasiado curioso para que a tangente não fosse perto demais. Mas será que um outro condutor não se desviaria um pouco demais para cima dele? Será que, dada a sua aparente alienação, poderia levantar voo se tal acontecesse?

Fascinou-me o animal, fascinou-me a situação. Cruzam-se nos nossos caminhos coisas que não esperamos, que mexem com os nossos instintos e podem provocar as mais variadas reacções. Coisas que nos fascinam, que nos chamam para tentarmos entende-las melhor, desfrutar delas mais um pouco, mas talvez nem sempre seja essa a melhor coisa a fazer; há certas situações que temos de nos contentar por passar por elas e por nos darmos por felizes por termos continuado o nosso trajecto sem interferir com elas, garantindo assim que não lhes provocaríamos qualquer prejuízo, esperando que após a nossa passagem, tudo corra bem para que o seu percurso possa também continuar sem interrupções bruscas.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Com um brilhozinho nos olhos

Estava a ver que não ia conseguir entrar aqui hoje. Logo agora que, após 3 meses e meio, consegui encontrar um minuto para escrevinhar alguma coisa, vi seriamente ameaçada a minha entrada no bloguer... isto porque o menu estava todo em árabe, da direita para a esquerda, onde as únicas palavras reconhecíveis eram as da minha conta de email que já aparece por defeito. Felizmente, mesmo escrevendo a password no sentido contrário, consegui entrar! Ah, tout ça parce que je suis au Maroc maintenant! C'est vrai. Mas felizmente que andei por muitos outros sítios entretanto... era isso que me vinha à cabeça agora, o diálogo que tive há pouco mais de um ano, quando enclausurado em casa em recuperação da operação, revelava as minhas ambições para o ano que então se fazia anunciar. 2007 seria, nos meus planos de então, um ano repleto de viagens pelo Mundo fora (porque a ideia era deixar a Europa para os anos de maior maturidade e explorar o resto do Mundo agora na frescura da juventude), com muitos continentes percorridos e muitas experiências para contar. Os planos não correram exactamente como o imaginado, pas de tout, mas numa perspectiva enviosada consegui muito do que queria. E não se julgue que a falta de crónicas ou relatos se deva à falta de concretização. Até porque não me recordo de ter viajado tanto num só ano.
Gostava (e pode ser que ainda o consiga vir a fazer) de relatar mais ao promenor todos os destinos e todas as experiências por que passei desde então, mas brevemente, consegui concretizar o desejo de voltar a matar saudades de Londres (business and pleasure); de matar saudades dos amigos que estão longe, não necessariamente no seu ponto de exílio, mas noutro país tão interessante como Itália (deu para conhecer Milão ao detalhe, o Lago Magiore, Florença, Pisa e Bolonha em contra relógio individual); descobrir de carro uma região tão bela como a Cataluña (mesmo que tenha implicado desilusões humanas), cheia de vilas à beira mar maravilhosamente calmas e agradáveis (Cadaqués), serras por descobrir (San Pere des Rodes), cabos por explorar (Cap de Creus) e ainda aproveitar para uma passagem breve por Barcelona para relembrar outras estadias; descobrir de bicicleta uma linda cidade que é Amesterdão (cujos atributos que a fazem hoje em dia chamativa para os turistas são o menos interessantes naquela rede de canais 'inundados' de velocípedes) e aproveitar para relaxar na bela Costa Vicentina, disfrutando de belas praias, grandes jantaradas e festa com os amigos. Por fim, heis-me aqui, au Maroc, por motivos de força maior, numa cidade alienada como é Casablanca. Pode ter o seu quê de interessante e belo, não só a cidade, mas certamente o país, mas a saturação do dia a dia não deixa grandes anseios por demorar muito mais. Mas justiça seja feita, que ainda há pequenos promenores que dão uma alegria no peito e revelam como as coisas menos vistosas podem ser bonitas na sua essência. E com isto tudo dá para ver como cumpri em parte os meus objectivos, sendo que afinal a Europa foi previligiada, mas ainda deu para por um pé em África pela primeira vez. Ficou por cumprir foi o desejo de ir fazer umas visitas à Big Apple, mas outras oportunidades surgirão.
Bem, fico-me por aqui porque o título deste post já se começa a justificar com o sono que me está a vir e para com o qual estou já em falta em algumas horas... (e espero que no fim de semana possa comprar o CD ao vivo e alegrar-me com esta e outras canções). Conto mais tarde recordar as outras experiências pessoais que me acompanharam nestas e em outras viagens no ano transacto - sim, porque agora já se iniciou outro ano gregoriano e há outros objectivos a (tentar) cumprir.